Um Antropólogo Em Marte - Oliver Sacks

Como pessoas com graves transtornos neurológicos podem viver uma vida razoavelmente normal e se adaptar a condições que não conseguimos nem imaginar? Somente um órgão tão maravilhoso como o encéfalo humano para proporcionar esse tipo de mistério. 

Se tem uma coisa que vai marcar o período de pandemia pra mim será o grande interesse que desenvolvi pelo cérebro, neurociências e afins. Depois de ler O Oráculo da Noite do Sidarta Ribeiro, não parei mais de estudar sobre o encéfalo e todo o sistema nervoso humano. Soma-se a isso o lindo agravamento do meu transtorno de ansiedade, devido à maléfica equação: Governo Bolsonaro + Vírus mortal+ Ignorância, e o resultado sou eu assistindo aulas de psicofarmacologia e lendo livros de neurologistas.   

Descobri que na Biblioteca Pública da minha cidade existe um acervo razoável de livros sobre o tema, entre eles alguns do Oliver Sacks, famoso por seus relatos sobre pessoas com danos cerebrais e professor universitário já falecido. Escolhi Um Antropólogo em Marte porque gostei do nome, mas pretendo ler os outros exemplares também, pois me apaixonei pela maneira como ele escreve. 

Esse livro traz a história de vários pacientes, entre eles um pintor que passou a ver tudo em tons de cinza, um rapaz que vive permanentemente no presente, um cirurgião com Síndrome de Tourette, um massagista cego que volta a enxergar, entre vários outros casos curiosos.

Como fica óbvio, o mais interessante desses relatos é a ironia contida em cada um deles, quando dizem que Deus é um brincalhão exemplos como esses logo surgem em minha memória. Mas o mais relevante de tudo pra mim foi a história do Greg.

O Último Hippie

Ele era um rapaz que decidiu se juntar à um grupo de monges. Durante o período em que ficou no monastério desenvolveu um tumor no lobo frontal do cérebro, que causou várias lesões levando-o a cegueira e perda de memória. Acontece que a condição do jovem não foi percebida pelos monges que acreditavam que os seus sintomas eram na verdade uma evolução espiritual. Como ele entrava em uma espécie de transe se não recebesse nenhum estímulo (isso simplesmente porque seu cérebro estava lesionado de uma forma que ele não conseguia estar no passado nem no futuro, sua vida só acontecia no presente), os monges acharam que ele tinha encontrado a iluminação. 

Greg tinha algumas lembranças do passado mas elas não vinham à consciência se não fossem estimuladas por algo no presente. Ou seja, esse rapaz alcançou o estado tão almejado por todas as pessoas que praticam meditação: viver no momento presente. Contudo, isso não é tão legal quando é a única coisa que você consegue fazer. 

Teoricamente, esse paciente não sofria, pois logo após receber uma notícia ruim já se esquecia dela, e não tinha noção de sua condição, nem ao menos percebia que estava cego. Não seria isso a perfeita descrição da felicidade? Viver apenas no presente sem sofrimento algum? Mas não era, sua condição era crônica e mesmo após participar de um show e conhecer a sua banda preferida, no outro dia ele não se lembrava de nada. Sua felicidade, assim como sua dor, não era duradoura. 

Portanto, nem sempre o que acreditamos ser o estado ideal de serenidade é o que idealizamos. Isso mexeu muito comigo, pois como boa ansiosa que sou, luto diariamente para estar no presente e não sofrer tanto. Greg foi umas belas tapas na minha carinha de aspirante à meditação! 

Um Antropólogo em Marte

O Antropólogo em Marte é, na verdade, uma antropóloga. Aqui Oliver Sacks conta a história da famosa engenheira animal Temple Grandin, e explica muito sobre a realidade das pessoas com autismo. Nesse caso, ela se diz uma antropóloga em marte porque sente que precisa estudar as convenções sociais como se fossemos alienígenas, porque nada disso é natural pra ela. Temple estuda nosso comportamento para saber como se comportar como um de nós, e se adequar à sociedade em que vivemos. 

Mesmo tendo várias dificuldades, por não entender muito bem as regras sociais e não ter vários sentimentos que pessoas neurotípicas têm, ela vive uma vida satisfatória. Tem amigos e é destaque em seu campo de estudo, famosa palestrante e professora. Ela superou a adversidade e encontra possibilidades em sua condição. Afirma que mesmo se houvesse a oportunidade ela não gostaria de deixar de ser autista, pois então não seria mais ela mesma.

Os presentes da vida

Essas histórias me levaram a pensar em como faz diferença quando você aceita a sua realidade. Já pensou se eles vivessem lutando contra algo que não podem mudar? A vida deles seria um verdadeiro inferno. Porém, eles não fizeram isso, eles aceitaram e aprenderam a lidar com o que lhes tinha sido oferecido, e procuraram viver da melhor forma possível. 

O relato de Virgil, por exemplo, o caso do cego que volta a enxergar, mostra que às vezes se livrar daquela condição a qual os outros acham terrível mas que para você é só parte da sua personalidade, pode ser pior do que conviver com ela. 

A gente pode pensar que se esses personagens não tivessem os danos que eles têm, viveriam uma vida mais plena. Mas a verdade é que eles estão contentes vivendo exatamente do jeito que são, e é essa a lição que eu tirei da leitura desse livro. Aceitar suas impossibilidades ao invés de passar a vida reclamando ou lutando contra elas vai te fazer mais feliz do que você possa imaginar. 



* A história do Virgil foi adaptada para o cinema com Val Kilmer no papel principal. Eu assisti esse filme há muito tempo atrás e nem sabia que era baseado em uma história real e muito menos no livro do Oliver Sacks. Quem quiser conferir o filme se chama À Primeira Vista.


10 Comentarios

  1. Essa leitura tem uma temática muito interessante, nós ensina a ver melhor as adversidades ,capacidade e aceitação das pessoas com algum tipo de deficiência.

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  2. Parece mesmo ser uma leitura bem interessante! Gostei!

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  3. O cotidiano para pessoas assim é outro, essa visão vinda de um profissional e ao mesmo tempo tão cotidiana parece excelente
    Gostei, muito legal,
    Um abraço, Alécia do Blog Arrojada Mix
    Blog ArroJada Mix

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  4. oi!
    Eu adorei a sugestão de leitura :D a temática do livro é bem interessante, já coloquei na lista de leitura

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  5. Deve ser uma leitura muito interessante, eu sou das que ama esse tio de literatura! Valeu pela dica!

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  6. Parece ser uma ótima leitura,vou procurar pra ler.obrigada pela dica.

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  7. Olá, tudo bem? Curioso esse seu interesse por essa temática hahhaa também às vezes tenho esses rompantes e vou a caça de livros no estilo também. Não conhecia esse título, mas depois de tudo que disse achei sensacional. Com certeza quero ler! Dica anotadíssima.
    Beijos

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  8. Achei a sua resenha interessante, fiquei curiosa para ler esse livro.

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  9. Olá?
    Confesso que estranheiro no incio, mas eu te entendo gosto de ler e buscar artivos e pesquisas cientificas isso de alguma forma me deixa motivada. De todas as mini resenhas o que eu procuraria a ler é "Um Antropólogo em Marte" foi algo que queria que você tivesse comentado mais, me bateu uma curiosidade, sabe?

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    1. Mas é pra te deixar mais curiosa mesmo, e você ler o livro! Essa é a intenção!

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